† Entrevistas


Entrevista com o Pároco da Paróquia Nossa Senhora de Fátima Padre Francisco Ivan, concedida à Alessandra Silva, da Arquidiocese de Fortaleza.


Uma conversa sobre devoção e fé


Pe. Francisco Ivan. Paróco da paróquia Nossa Senhora de Fátima e Coordenador Arquidiocesano de Pastoral


Os meses do ano são conhecidos popularmente por estarem associados a momentos festivos e de lazer. Janeiro e Julho são os meses das férias escolares. Fevereiro sinônimo de carnaval. Março, em forma de piada é tido como o início oficial do ano, pois no Brasil o ano só começa depois do carnaval. Abril é páscoa. Junho é famoso pelas festas juninas. Outubro por ser o mês das crianças. dezembro é natal. E maio, como é conhecido? O que é vivenciado no mês de maio?


Essas e outras perguntas foram temas de uma conversar com pároco da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, Padre Ivan Souza. A entrevista realizada sobre o olhar cuidadoso da Virgem de Fátima, numa tarde calorosa de Fortaleza, é regada de emoção e de expressões de fé. Como nossa conversa foi longa, resolvemos dividi-la em três partes. Esperamos que essa entrevista, não seja simplesmente, mais uma informação. E sim um instrumento de estudo, de formação pastoral, de Evangelização.


Para começarmos, queria que explicasse o que é vivenciado no mês de maio. Como ele é conhecido. Porque ele é tão especial.


Padre Ivan - O mês de maio é muito chamativo por conta da história das noivas, da mulher, de Maria. Porém, pelos textos da liturgia, o mês destinado a Maria seria o mês de dezembro, que é o período do Advento. Esse tempo litúrgico, que fala da mulher que é capaz de transformar, da mulher que é capaz de aprender com Jesus, da mulher que é capaz de ser sinal de Deus. Mas, para nós popularmente convencionou o mês de maio como o mês das noivas. Os casamentos eram todos celebrados nesse período. Agora, os casamentos acontecem, sobretudo, no período de férias. No entanto o mês de maio ainda diz muito das mulheres, das flores, das noivas, das mães. Está relacionado a devoção, a novena, a um voltar-se para Nossa Senhora.


O relacionamento dos católicos com a Mãe de Jesus é criticado por alguns, por acharem que existe certo exagero. E quando se fala no mês de maio as críticas aumentam. Então é um exagero a devoção a Nossa Senhora?


Padre Ivan - Eu penso que cada vez que nos aproximamos de Nossa Senhora, cria-se em nós um sentido de vida. Por isso, quem está perto de Maria não está distante de Jesus. E quem está com Jesus não está distante de Maria. Estar com Jesus e estar com Maria também. Por que ela é aquela que cuida da vida. E ai, eu acho que não é exagero. Porque ninguém pode nos questionar, ninguém pode dizer que não é verdade, que o sangue de Jesus não passou pelo sangue de Maria. A partir do ventre o sangue de Maria passou pelo sangue de Jesus. E consequentemente, o sangue de Jesus passou pelo sangue de Maria. E aí está o sinal de Mãe que é aconselhadora, auxiliadora e protetora.


Gostaria que o Senhor explicasse melhor essa relação maternal, que se tem com a Virgem Maria.


Padre Ivan – Você vê que a maioria dos filhos, sobretudo nós que passamos pela adolescência, e assim podemos falar por vivência. Que quando queríamos pedir alguma coisa ao pai, primeiro a gente ia pedir a mãe. A gente falava assim: mãe me dê isto ou mãe fala com papai ou mãe facilita isto. Isso acontece por que a mãe também é como útero. E o útero é como uma matriz, aquela que gera. Por isso que eu digo que não é um exagero, no sentido de que é preciso a gente compreender esta maternidade de Maria. Essa maternidade que atravessa todo o materialismo, o socialismo, o capitalismo e a globalização. Quer dizer que todas estas coisas não conseguiram acabar com essa relação.


E quais os sinais que indicam que essa relação maternal não se esgotou?


Padre Ivan - Quando a gente pensava que, neste século, fosse diminuir a questão da espiritualidade, apareceram diversas formas de expressões de fé. Umas que a gente aprova e outras que não se aprova. Mas o culto a Virgem Maria, para mim, nasce dessa genuína fé que recebendo ao longo dos anos, pela vivência no meio do povo e no meio da comunidade. Por isso, precisamos compreender e respeitar cada gesto de fé. E mesmo sem entender, respeitar o porquê que as 4h30min da manhã, na Avenida 13 de maio, já tem engarrafamento. Isso acontece todos aos dias 13 independente do mês. Mesmo com chuva às 4h30min a Igreja já esta lotada. Isso mostra que há algo mais, que não é só uma alienação, um comodismo, uma promessa, uma busca de solução para um problema. Tem algo a mais.


E o que seria esse algo a mais, que perpassa a razão, a compreensão?


Padre Ivan – Eu penso que ai ao redor de Nossa Senhora, como mulher, tem uma mística. E a mulher tem muito disto. É mais sensível, ela é detalhista. Se você perguntasse para mim hoje, Padre quem você contrataria como funcionário da Igreja, mulher ou homem? Eu responderia de imediato, mulheres. Porque as mulheres são mais detalhistas, são mais sensíveis. As mulheres veem as coisas longe. E Maria tem muito disto. Não é que nós homens não tenhamos. A gente tem menos, a gente consegue olhar menos. As mulheres vêm mais detalhes. Por exemplo, se o namorado sai e chega com um fiapo na roupa, de longe a namora vê, vai lá e tira. Caso ele chegue com um perfume diferente, rapidamente ela comenta: este perfume não é seu. Já o homem não percebe esses detalhes.


E quais as motivações que trazem as pessoas para o Santuário?


Padre Ivan – As buscas são diversas, por exemplo: alguns chegam aqui (na Igreja), afirmando “esta é minha tábua de salvação”, “é a minha última esperança”, “minha última esperança é aqui”. Mas, tem aqueles que vêm por conta das promessas. Outros por uma questão de fé, por uma questão, de aprendizagem. Por isso, que esta amizade com Nossa Senhora, e toda esta presença aqui, exige de nós um entendimento a respeito da religiosidade popular. E, sobretudo, a religiosidade popular diante dos santuários. Pois, os santuários parecem um lugar místico, que a gente não sabe explicar ao certo. Mas tem algo místico nesse pedaço de chão aqui.


Falando do aproximar-se de Maria, qual seria a melhor forma de uma aproximação sem exageros?


Padre Ivan – Essa é uma pergunta importante. Lembro, que a construção da imagem, de Nossa Senhora de Fátima, aqui da praça gerou muita confusão. Alguns evangélicos queriam retirar a imagem, alegando que o espaço é público. Isso mostra que há aqueles que têm uma aproximação, mas também têm outros que são afastados. Então, eu acho que uma das melhores maneiras de compreender Maria, é percebê-la como co-redentora.


Co-redentora como assim?


Padre Ivan – O convite que Deus faz a Maria, lhe dar uma missão muito especial. Ela está em pé de igualdade com Cristo. Não por que ela é Cristo ou Cristo é Maria. Cada um tem sua função, cada um tem sua ação dentro da história da salvação. Mas Maria tem uma Missão, tão importante, a partir da anunciação do anjo. Ao responder “eis aqui a serva do senhor”, Ela se colocou a serviço, se dispões. Eu compreendo Maria, no sentido que a gente seja disponível na comunidade. Onde sejamos disponíveis na história que nós realizamos. E que se tenha compromisso com esta história.


Eu gostaria que o Senhor, explicasse melhor essa relação com a comunidade. Esse demonstrar compromisso com a história.


Padre Ivan - Hoje, (na Paróquia) nós compreendemos Maria como a abertura do Santuário. Longe de nós fazer um Santuário fechado, uma redoma. Onde três ou quatro pessoas mandam. O que queremos é abrir o santuário para a cidade de Fortaleza, para o mundo. Para dizer: olha aqui nos também temos a oportunidade de sentir a fé, de viver a fé, de compreender a fé. E nesse sentido se dará nossa aproximação com Maria. E essa aproximação irá acontecer pela contemplação e pela ação.


E como seria essa contemplação?


Padre Ivan – Seria contemplar a imagem de Maria, como se contempla sua Mãe. Assim como o esposo contempla a esposa. Como o namorado contempla a namorada. Como Deus contemplou a figura de Maria. Da mesma forma que Deus se agradou da Criação. É assumir a frase “façam tudo o que Ele disser”, “tudo o que Ele mandar”. É assumir a vontade de Nossa Senhora. Aí eu me pergunto: por que temos 120 mil pessoas nas ruas, no dia 13 de maio? E um dia meu pai (que não tem estudo, que não tem muito conhecimento) me disse: “meu filho esta questão, de muita gente, é a mãe que chama para acompanhar o filho dela”. E é isso mesmo; é a Mãe que chama para o Filho. Quem está em evidência é o Filho. É o Filho que estará na mesa (altar), quem vai acolher este povo. Sendo assim, a aproximação se dá desta duas formas: pela contemplação e pela ação.


Você colocou que temos duas maneiras de nos aproximarmos de Maria. Uma pela contemplação e outra pela ação. Então pergunto, as duas maneiras estão associadas? Como?


Padre Ivan - Quando você contemplação Maria a partir de textos, das oração, da Ave-Maria. A partir do Evangelho, você vai compreendendo que esta contemplação, nesta oração, você também tem uma ação para desenvolver na sociedade. É preciso desenvolver a cidadania, a exemplo de Maria que é capaz de atender o povo na hora que faltou vinho. Que é capaz de acolher as pessoas, na hora de uma necessidade. Então Maria é aquela que a cidadania perfeita. E que não abre mão da sua cidadania, de sua fé. Porque na cruz Ela poderia ter fugido. Mas Ela não foge em nenhum momento.


Dentro das inúmeras posturas de Maria, qual delas seria urgente colocarmos em prática em nossa sociedade?


Padre Ivan – A passagem que me deixa muito feliz é quando Maria está no alto da cruz com o Filho e João está também ao lado dela. E Jesus diz para Ela “Mulher eis aí o teu filho, filho eis aí tua mãe”. A partir daí a gente vai compreender como Maria é importante na história da salvação. Naquele momento ela se torna mãe de toda a humanidade, queiramos ou não. E agora João é também colocado como filho. Maria é esta que gera muitos filhos. Maria é esta que tem muitos filhos. E isso acontece quando Jesus faz esta grande apresentação e a coloca como mãe da humanidade. Ao mesmo tempo que coloca os discípulos como responsáveis por aquela mulher. E é João quem vai acolher Maria e vai levá-la para casa. Por que Maria está desolada, está sozinha. Então, como discípulo nós temos que levar Nossa Senhora para casa todos os dias. No sentido de que Ela é mãe, é protetora. Fazendo-nos acreditar que é possível passar por tudo que Jesus passou, sem fugir da cruz.


Além da imagem de Maria diante da cruz, indique outra imagem que devemos vivenciar no dia-a-dia?


Padre Ivan – Uma outra passagem seria a Bodas de Caná. Onde na hora que falta vinho e vão falar com Maria, e ela só diz uma palavrinha: “façam o que Ele disser. Façam o que Ele mandar”. Então, Jesus Caminho, Verdade e Vida é quem dá a orientação, é quem dá a luz e que abre os horizontes. E porquê numa festa de casamento? Por que o casamento é um sinal de vida, é um sinal de benção da criação, é um sinal de Deus, é um sinal de vida nova. E a gente vai compreendendo que essas passagens cada uma tem uma mensagem, um foco diferente, que nos ajuda a compreender. A Bodas de Caná e passagem da Cruz, elas têm algo muito forte na minha vida. Eu não posso desistir da minha cruz. E a cruz vista não como algo de sofrimento, de dor. Mas, como transformação de vida, de aprendizado.


E senhor poderia exemplificar esse processo de transformação?


Padre Ivan – Vou usar o exemplo do casamento. Na relação um vai aprendendo com o outro. Não é que o homem vai transformar a mulher, ou a mulher vai transformar o homem. Os dois vão aprendendo e crescendo juntos. Onde não existe alguém que manda ou que determina tudo. Mas é na caminhada que a gente vai aprendendo um com o outro. É essa a missão dos bons relacionamentos, de aprendizado. Em que nós somos eternos aprendizes, neste caminho de Nossa Senhora e do Evangelho.


Nós temos hoje mulheres sendo mães cada vez mais jovens. E a mídia tem veiculado vários casos de abandono de crianças e de aborto. Isto é sinal de que a maternidade está fragilizada? Estamos nos distanciando desta postura da mãe materna?


Padre Ivan – Hoje, todos nos sabemos que existe por parte do Governo, espaços destinados a receber crianças que os pais não podem criar ou que são rejeitadas. Acho que se o casal tem um filho ou a mulher tem um filho, e não podem criá-lo, o primeiro passo é procurar um desses espaço. E pergunta onde pode deixar esta criança com segurança, com zelo, com cuidado. Por que deixar uma criança no lixo, ou no canal, ou num espaço de risco é crime. E a gente não quer isto para ninguém, imagine para uma criança. Até por que, mesmo Jesus nascendo numa estrebaria, ele teve o cuidado da mãe, teve o cuidado da família. Então toda criança merece ser amada e respeitada. Com a criança e o idoso devemos ter um carinho especial. Mas, por outro lado, olhando para a questão ética, a gente sabe que a maternidade deveria ser mais preparada. Se alguém me perguntar, quanto tempo devo me preparar para ser pai e ser mãe. Para mãe pelo menos 50 anos e para pai pelo menos 60. Por que se você olhar hoje, na maioria das vezes é a mãe que assume a criança (refere-se a mãe solteira). Na igreja eu penso que (um dado sem muita pesquisa, sem muita estatística), mais de 60% são as mães que assumem a família. São chefes de família. Por outro lado, agente nota, que a mãe sobretudo jovem, que não foi preparada para a maternidade é propicia a acontecer essas coisas.


E exitem outros fatores, além da idade, que podem influenciar?


Padre Ivan – Outro fator seria a depressão pós-parto. Onde tanto a mãe sofre, como a criança. Mas, eu penso que a maternidade deve ser melhor trabalhada. Porque é tão sublime o útero da mãe, é a matriz, é o que gera. Então a criança é uma obra de Deus, é dom. Hoje eu estava conversando com uma mulher de 42 anos, que esta grávida. E ela me dizia, que vai largar tudo para ir para Belém do Pará ficar ao lado da família e cuidar do filho. Ela vai fazer isso, porque a pessoa que ela trabalha a orientou para abortar a criança. E ela disse não, “eu vou criar o meu filho”. E essa foi uma lição, não só para a patroa dela, mas para todos nós. Este caso, nos faz perceber que existem casos chocantes, mas há pessoas que tem uma responsabilidade com a maternidade. Pois só entende quem é mãe. Quem não é mãe não entende.


E para quem sonha em ser mãe, que postura deve assumir?


Padre Ivan – Para mim, colocar filho no mundo não é só uma questão cristã, é também uma questão ética. E quando digo uma questão ética é o “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. É que o amor seja maior do que o dom da vida. É que o amor seja maior do que a realidade em que estamos vivendo. Essa criança que vem (irá nascer) precisa ser bem cuidada, precisa ser bem tratada. E se você não tem casa, não tem emprego, não tem família, não tem dinheiro, não tem condição, como você vai cuidar de uma criança?


E qual deve ser a nossa postura (como Igreja) para essas mulheres, que vivem uma maternidade conflituosa?


Padre Ivan – A primeira postura é entender que só compreendemos o outro quando entramos nele. E como Igreja nós não podemos apontar o dedo para o outros. Outra postura seria a de Jesus “Eu vim para que todos tenham vida”. E que condição a gente poderia dar para essa pessoa resgatar o dom da vida. Para que ela perceba que é possível transformar essa realidade. Por isso, esse tema de nossa festa é: “Com a Virgem de Fátima cuidamos da vida”.


Nossa Senhora de Fátima, Nossa de Guadalupe, Nossa Senhora da Assunção, Nossa Senhora da Conceição, e tantas outras. São nomes dados a Mãe de Jesus ou todas são diferentes?



Padre Ivan – Sobre a pergunta, primeiro são vários nomes de Maria, várias invocações para uma mesma Maria. Então, Nossa Senhora do Amparo é a mesma Mãe de Deus. Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Nossa Senhora do Bom Parto é a mesma Mãe de Deus e a Nossa Senhora de Fátima é a mesma Mãe de Deus. Só quê Ela se manifesta diferente devido às situações. Vou explicar melhor: aqui na Arquidiocese de Fortaleza nós temos no Tancredo Neves a Nossa Senhora dos Pobres. Que diz muito da realidade da comunidade, que no passado era uma comunidade muito carente, muito difícil. Outro exemplo, Nossa Senhora da Assunção porque nós começamos lá na ponte do Rio Ceará, com a capelinha de Nossa Senhora do Amparo. Depois, veio o Forte de Nossa Senhora da Assunção e hoje, temos a Nossa Senhora da Assunção. Nossa Senhora Aparecida do Brasil tem toda uma história em que Ela se manifestou. Então são muitos nomes para uma mesma Maria. São muitos nomes, mas uma única fé. Para as comunidades é muito importante saber que existem várias maneiras de se chamar Maria. Ela será a mesma ontem, hoje e sempre.


E aí pergunto: por que Nossa Senhora de Fátima é tão querida? Por que as comunidades, mesmo tendo outro padroeiro, reúnem-se todos os dias 13 para celebrar?


Padre Ivan – Depois de Portugal, o lugar que mais concentra devotos da Virgem de Fátima é Fortaleza. Em 1916, em Portugal, o anjo da paz aparece aos três pastorinhos Francisco, Jacinta e Lúcia. Ele aparece no momento da primavera, do verão e outono. E nos três momentos, ele aparece para dizer que é o anjo da paz, que não precisa ter medo. Preparando o cenário para as aparições de Nossa Senhora. E nesse período estava acontecendo a I Guerra Mundial, o comunismo era muito forte. E o anjo trás consigo o sentido de paz. Qual a mensagem do Anjo? Que a gente adore à Deus Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo). E essa é a primeira experiência de cada pessoa, porque a Trindade é comunhão, é comunidade, é diálogo, é paz entre nós. E 1917 acontecem três aparições, e a primeira é no dia primeiro de maio. Em todas as aparições Nossa Senhora pedia conversão, penitência e oração. É o que a vida cristã pede para nós.


E como é possível vivenciar esses três pilares: conversão, penitência e oração?


Padre Ivan – Se a justiça, o bem comum não passar pelo nosso coração, a gente não se converte. É preciso a gente fazer penitência no sentido de sermos melhores, de aprendermos mais com o Evangelho, com a Bíblia, com os exemplos, com os sinais do tempo. É muito importante para eu, você, qualquer outra igreja, outra comunidade rezar, orar. Porque quem tem uma vida de oração tem uma vida centrada, focada nos seus projetos. Tem uma vida mais equilibrada, porque ela tem uma espiritualidade. E quando você tem uma espiritualidade é notável e quando você não tem também a gente nota.


Então, porque o dia 13 é tão forte em Fortaleza?


Padre Ivan – Primeiro porque há um trabalho desde 1955. Quando a imagem peregrina visitou Fortaleza, por volta de 1951, já se tinha a idéia de santuário, e foi-se criando a mentalidade do dia 13. E porque não celebrar no dia 13? Antes as celebrações eram só pela manhã, depois foi se criando esse movimento para o meio dia. E hoje, em todo o Ceará no dia 13 acontecem celebrações, principalmente ao meio dia. Aqui no Santuário de Fátima são 11 celebrações, de 5h às 20h. E em todas as celebrações se tirarmos o pé do chão, não tem como colocá-lo de novo. Todas às celebrações são lotadas. Nos dias 13 comuns são de 30 mil a 40 mil pessoas. E no dia 13 de maio são 100 mil, 120 mil pessoas. Em 2010 foram 120 mil. Esse ano a gente pensa que vai ultrapassar os 120 mil. E no mês de outubro são cerca de 60 mil a 80 mil pessoas.


Esses números indicam um aumento na devoção à Maria?


Padre Ivan – Eu penso que sim, porque realizamos um trabalho nos último três anos aqui no Santuário. Primeiro relacionado ao horário, antes o Santuário era aberto de 15h até as20h. Hoje, está aberto das 6h as 20h. Segundo, fizemos uma ampla divulgação, isso nos levou a ser o único que temos uma missa transmitida pela TV (TV Diário, canal 22). Com esse trabalho da TV, associado ao rádio (FM Dom Bosco) e as panfletagens a gente cresceu muito em número. E essa divulgação, através das mídias, ajudou a ampliar a participação dos fiéis no Santuário. Por isso, nós somos convidados a vivenciar cada vez mais essa experiência do santuário, que é um chamado. Há um chamamento. Quantas pessoas assistiram a missa, às 5h, pela TV, pelo rádio, pelo site e pelo blog da Paróquia. Um dia eu fiquei surpreso, porque eu dei um comunicado na missa, e quando eu cheguei numa reunião, a tarde, todo mundo já sabia da notícia, porque estavam acompanhando pelo blog. E pessoas de São Paulo, de vários lugares tinham recebido essa notícia. Isso nos faz perceber como a comunicação é veloz, é rápida e nós como Igreja não estamos preparados para lidar com essas mídias. Precisamos avançar, principalmente com a juventude onde tudo é digital. Enquanto engatinhamos, eles (jovem) estão com o twitter, facebook, Orkut. Mas, a participação no dia 13 acontece, porque hoje há uma divulgação maior do Santuário.


E o quê ainda é preciso ser feito?


Padre Ivan – É importante, primeiro, o zelo missionário, o trabalho de todos. Nós já investimos em segurança, instalamos câmeras, banheiros. Disponibilizamos água potável para o povo. Realizamos campanhas de coleta de sangue para o Hemoce, o cadastro de medula óssea. Essas iniciativas mostram que além de rezar tem uma atividade, tem uma ação. É a contemplação que gera ação. E o que estamos fazendo agora é a coleta seletiva do lixo. Nós estamos investindo muito nessa campanha, porque com as chuvas os bueiros (do Bairro de Fátima) ficaram todos entupidos. Outra preocupação é com o lixo na Praça Pio IX (em frente da Igreja). Quando nós chegamos aqui eram retirados de 10 a 12 toneladas de lixo, após a festa. Hoje é 1 tonelada e meia. Isso é resultado de um trabalho de conscientização feito com os barraqueiros, com os fiéis, com as escolas, com a Prefeitura, com a SEMAM, com a EcoFor. Então a gente tomou como atividade durante esses três anos (2009, 2010, 2011), a coleta seletiva do lixo, a coleta de sangue e o cadastro da medula óssea. Agora existem muitas carências. Precisamos de espaço para estacionamento, de uma sala para os milagres, de um fraldário, de um espaço para acolhimento dos romeiros. Esses espaços são muito importantes para podermos acolher bem.


E o vestir branco? Por que as pessoas festem o branco no mês de maio, no dia 13?


Padre Ivan – Primeiro porque nas aparições de Nossa Senhora é colocado como uma senhora branca. Que uma senhora de veste branca aparece no céu. E o branco, também, é como sinal de paz, de serenidade. A harmonia de todas as cores para expressar um sinal de fé. Então, quando alguém faz o voto de vestir-se de branco, ela faz esse esforço em sinal de respeito, de atenção, de uma continuidade da história da aparição da Senhora de branco. Isso simboliza que ela (Nossa Senhora) continua não mais no altar, mas em mim. Agora não é só ela, sou eu também. Agora eu também represento essa mulher, essa senhora. Mas, nem todos têm essa consciência, embora a grande maioria esteja se conscientizando de que não é, mas Maria sou eu. Eu vou fazer o papel dela na sociedade amando, respeitando, sendo justo e honesto. Também com minhas rezas, com minhas orações.


E a reza do terço?


Padre Ivan – Para nossa surpresa, aqui no santuário o novenário não tinha a oração do terço. A gente fazia antes de começar a novena. Desde 2010 nós colocamos, no mês de maio e outubro, o terço durante a novena. É belíssima a concentração e a participação. Todo o povo na Igreja rezando o terço, mesmo os que não sabem rezar. É uma experiência para nós de muita dedicação deles e de muito prazer. Então, a oração do terço marca, também, essa contemplação deles, marca a espiritualidade. Por outro lado, a gente tem a idéia de que eles queriam rezar mais, de passar mais tempo em oração. E o terço é um bom momento para você permanecer em oração. Agora é preciso colocar o terço em sintonia com a realidade social, com a realidade da vida. Para que se entenda que a oração exige uma postura transformadora, exige uma ação. E a reza do terço é muito especial, porque para muitos ele é penitência, é conversão e oração ao mesmo tempo.


E por que é comum ao rezamos, o terço, deitados dormirmos com facilidade?


Padre Ivan – Isso acontece porque o terço é terapêutico. Se você tem um doente, um paciente e reza com ele o terço, é uma maravilha. Porque ele vai se acalmando, ela vai se tranqüilizando. E alguns terapeutas já afirmam que a oração é indispensável na vida de qualquer enfermo, sobretudo quando precisa de uma terapia.


Padre Ivan, para uma pessoa que pretende viver melhor o mês de maio, o que ela pode está fazendo?


Padre Ivan – Ela precisa se sentir, primeiro, participante de uma comunidade. Precisa saber que não está sozinha. Precisa saber que faz parte dessa comunidade. Segundo passo, dentro de toda a correria diária, qual é a hora que você tem para se encontrar com essa comunidade? E a partir da vida de Maria, da vida de Jesus e da vida desse povo, se encontrar. Se encontrar não para rezar logo, de imediato. Mas, se encontrar para conversar, para partilhar a vida. Tendo a figura de Maria que chama (convida). E só chama quem tem chama. E quem não tem chama, não chama ninguém. Maria tem muito disto, essa chama que acolhe. Depois é necessário compreender que, o mês de maio tem uma mensagem para nós de conversão, de oração e penitência.


Para finalizarmos essa entrevista, quem é Maria para o Padre Ivan?


Padre Ivan – Eu tenho uma amizade todo especial com Maria. Eu tenho um cuidado, todo um zelo. Eu acho que uma paixão, no sentido de tentar penetrar na alma de Maria. Eu tenho uma vontade de dizer sim, como Ela disse “sim”. De ficar disponível como Ela foi. De ter essa coragem, de ir a cruz como Ela foi. E de viver, realmente, essa realidade, esse chama. O que mais me admira em Maria é esse chama que Ela tem. E essa é uma das qualidades que eu queria ter. E essa qualidade de chamar, de convocar e de dizer “olha esse povo aqui é um povo de Deus, é um povo que vai fazer alguma coisa pela humanidade, a partir de uma experiência pequena de oração”. Maria para mim é essa co-redentora que vem também para educar a Igreja. Para dizer que nossa vocação precisa melhorar. Para dizer que a nossa missão tem que dar um salto qualitativo. Para dizer que a gente deve ficar mais disponível. Mais aberto não só para o trabalho com as mulheres, com os homens, mas, sobretudo para a realidade. Então, Maria para mim é esse sinal de abertura, é um novo horizonte que vai me fazendo cada vez mais feliz. Eu zelo a Mãe com todo cuidado, como eu tenho que zelar por você, como eu tenho que zelar por qualquer pessoa. Pois Maria nos ensina que o cuidado com o outro não tem limite.